Legislação

PARECER CNE/CES Nº 215 DE 11 DE MARÇO DE 1987 - BRASILIA / DF

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Dispõe sobre a reestruturação dos cursos de graduação em Educação Física, sua nova caracterização, mínimos de duração e conteúdo.

Conselho Federal de Educação – DF

CCC – Parecer 215/1987, aprovado em 11/03/1987 (Proc. 23001.000291/83-1)

Dispõe sobre a reestruturação dos cursos de graduação em Educação Física, sua nova caracterização, mínimos de duração e conteúdo.

 I – Relatório

- Antecedentes

A reflexão em torno dos problemas que envolvem a formação do Licenciado e do Bacharel em Educação Física, bem como a do Técnico Desportivo – formação essa entendida na dimensão integral dos respectivos perfis profissionais sob o ponto de vista filosófico, cientifico e político – vem sendo objeto de um amplo processo de debates que se desenvolve com regularidade desde 1978.

Nesse sentido, a evolução do pensamento da comunidade acadêmica da Educação Física, acompanhando o amadurecimento do debate educativo em torno dos anseios e das reais necessidades da sociedade brasileira, tem sido registrada em sucessivos encontros, simpósios e seminários, com a participação dos especialistas da área e o envolvimento dos professores e alunos da grande maioria dos 96 cursos de Educação física em funcionamento no País.

Dentre os aspectos mais relevantes nos temas abordados destacam-se, sem dúvida, a questão do perfil profissiográfico do Licenciado e do Bacharel em Educação Física; o posicionamento do Técnico Desportivo; os conteúdos curriculares, diante do confronto entre o desejo de exercer o direito de estabelecê-los com ampla liberdade, de acordo com a concepção de cada curso, e as exigências dos mínimos obrigatórios, fixados pela legislação; o problema das cargas horárias e da duração mínima dos cursos, a pós-graduação e as especializações, dentre muitos outros.

O currículo mínimo, a duração e a estrutura vigentes dos cursos superiores de graduação em Educação Física e Desportos fixados pela Resolução 69/69, do Conselho Federal de Educação, a partir de seu Parecer 894/69, tem merecido análises, avaliações e críticas em todos os encontros de professores, estudantes e profissionais da área, que a partir de então se realizaram. 

Objetivando o estudo específico de alterações dessa estrutura curricular atual para a formação do profissional de Educação Física e Desportos, a comunidade acadêmica da especialidade reuniu-se em 1979 no Rio de Janeiro e, em 1981, em Florianópolis.

As conclusões do Encontro de Florianópolis (1981) vieram a se consubstanciar na primeira proposta concreta, numa linha de consenso quanto aos seus pressupostos básicos, a partir da reunião de Curitiba, em 1982.

Essa proposta, após ter sido objeto de amplas discussões e críticas no seio da comunidade acadêmica, inclusive por ocasião do Encontro dos Diretores das Escolas de Educação Física do Brasil, realizado em março de 1984, na Escola de Educação Física da USP/SP, foi transformada no anteprojeto encaminhado ao Conselho Federal de Educação, a quem cabe, por lei, a responsabilidade pela fixação da duração e do currículo mínimo dos cursos superiores (Art. 26 da Lei 5.540/68).

Para proceder ao encaminhamento do processo de reformulação do currículo mínimo do curso de Educação Física, a partir desse anteprojeto, o Presidente do Conselho Federal de Educação, de acordo com o rito processual adotado neste Colegiado, criou, através da Portaria 10/84, um Grupo de Trabalho que passaria a trabalhar vinculado à Comissão Central de Currículos do CFE, integrado por representantes da SEED/MEC, do CND e especialistas e professores de diferentes instituições de ensino superior, coordenados um Conselheiro-Relator (inicialmente, o Conselheiro Virgínio Cândido Tosta de Souza).

Ainda em 1984, esse anteprojeto foi encaminhado pelo Conselheiro-Relator, através do Ofício Circular-CFE 1.969/84, às 95 instituições de ensino superior que à época ofereciam cursos de Educação Física, solicitando uma manifestação a respeito.

A esse expediente, inicialmente, apenas 16 escolas atenderam. Em meados de 1985, através do Ofício-CFE 1.521, o pedido foi reiterado às que não o haviam respondido. Com essa medida, o total de 44 das instituições que mantinham ensino superior manifestaram-se oficialmente a respeito do assunto, expressando sua concordância, enviando sugestões, fazendo críticas ou propondo modificações.

Em julho de 1985, o Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Dr. José Sarney, cria uma comissão, integrada por personalidades com larga vigência no campo desportivo, a fim de oferecer subsídios à formulação de uma nova política nacional para a Educação Física e os Desportos.

Em novembro de 1985, havendo assumido a Presidência da Comissão Central de Currículos do CFE, o Conselheiro Virgínio Cândido Tosta de Souza designa o atual Relator para substituí-lo no prosseguimento dos trabalhos.

Em 31 de janeiro de 1986, o Exmo. Sr. Ministro da Educação, Senador Marco Maciel, através da Portaria MEC 83, constitui a Comissão de Especialistas de Educação Física, para atuar junto à Secretaria da Educação Superior daquele Ministério nos termos da Portaria MEC 706/85.

No dia 16 de abril de 1986, o Diretor da Escola de Educação Física da USP, Prof. Jamil André, fez realizar em São Paulo uma reunião informal com representantes de diversas Escolas de Educação Física, particularmente das situadas naquele Estado, a fim de debater as propostas curriculares que estavam utilizando e demais questões relacionadas às modificações que consideravam ser necessário introduzir na formação dos profissionais de Educação Física. Participaram dessa reunião, representantes de cerca de 20 escolas, inclusive este Relator, na condição de observador.

Além da participação nos debates, onde registraram sugestões e manifestações críticas as mais diversificadas, essas escolas apresentaram, em documentos específicos, as grades curriculares que desenvolviam ou pretendiam vir a desenvolver.

Em junho de 1986, reúne-se novamente em Brasília o Grupo de Trabalho instituído pela Portaria CFE 10/84 para, a partir de uma agenda pré-estabelecida, iniciar a fase de consolidação e síntese de todos esses estudos, relatórios e documentos recebidos com sugestões, críticas e proposições as mais diversas.

Os trabalhos resultantes dessa reunião chegaram às seguintes conclusões:

1º - Reconheceu-se à pertinência dos princípios norteadores da proposta emanada do Encontro de Curitiba (1982), mesmo diante da nova política pretendida para o desporto brasileiro, proposta esse agora amadurecida pelo debate e atualizada em consonância com o momento vivido pelo ensino superior.

2º - Ratificou-se o entendimento de que seria imprescindível a manutenção da linha de autonomia e flexibilidade contida nessa proposta, o que possibilitaria a cada instituição elaborar seu próprio currículo com ampla liberdade para ajustar-se, numa ótica realista, às peculiaridades regionais, ao seu contexto institucional e às características, interesses e necessidades de sua comunidade escolar, quer no plano docente, quer no discente.

Essa autonomia viria propiciar uma adequada formação, que conciliaria, dentro de uma visão mais ampla, a realidade regional de um mercado de trabalho fragmentado, em nível das estruturas da educação escolar (estabelecimentos de ensino regular; pré-escola, 1º, 2º e 3º graus) e da não-escolar (academias, clubes, condomínios, hospitais psiquiátricos, áreas de atendimento a deficiências diversas, etc.), com a necessária preparação de um profissional que possuiria visão ampla da realidade social, política e econômica do País, e consciente das reais possibilidades dos cidadãos. Este profissional com conhecimentos mais abrangentes deveria dominar os instrumentos, métodos e técnicas necessários ao desenvolvimento de suas atividades; ser capaz de identificar as necessidades regionais, refletindo e decidindo autonomamente, propondo e aceitando mudanças, preocupando-se em adequar os recursos disponíveis a fim de fazer da Educação Física e dos desportos um meio eficiente e eficaz de auxílio aos alunos, proporcionando-lhes desenvolvimento integral e estimulando-os a um viver cooperativo dentro da complexidade de nossa atualidade social, política e econômica.

Esse profissional foi visto como o protagonista de uma Educação Física que se caracterizaria como um fenômeno de marcante universalidade, no quadro de uma educação permanente e objetiva, capaz de contribuir para  o desenvolvimento integral de nosso povo.
Nessa linha intencional de formação profissional harmonizar-se-ia a necessária unidade dos princípios filosóficos e educacionais da Educação Física nacional, com os interesses, necessidades e peculiaridades regionais.

3º - Identificaram-se como casuísticos, e sem uma base mais sólida de sustentação, os argumentos de que a proposta criaria dificuldades ou mesmo impediria a transferência de alunos, além de possibilitar fraudes no desenvolvimento dos cursos.

Com relação ao argumento casuístico da transferência de alunos, conclui-se que os currículos não seriam tão dispares pela delegação da autonomia pretendida, visto existirem na proposta apresentada referenciais básicos e de consenso nacional sobre a formação do profissional de Educação Física e Desportos, além do amparo à estruturação curricular da IES indicado nas estratégias de implantação e implementação da proposta do novo currículo.

Foi também lembrado ser comum que as IES tenham mecanismos internos de ajustamento de alunos transferidos, além de existir na normatização emanada do próprio CFE/MEC sobre transferências, orientação que dispõe sobre o assunto.
No que diz respeito à possibilidade de virem a surgir fraudes no desenvolvimento dos cursos, não seria a imposição de uma listagem de disciplinas com fixação de suas cargas horárias o que viria inibi-las. A qualidade de um curso não resulta apenas da argumentação de que “os mínimos curriculares foram cumpridos”.

Somente a prática sadia da autonomia universitária poderá eliminar a dicotomia existente por vezes em nossas IES, quando confrontados o discurso e a ação. Esse exercício de liberdade acadêmica, certamente, propiciará o surgimento e o amadurecimento de marcos conceituais identificados tanto com os ideais nacionais da Educação Física, quanto harmonizados com as peculiaridades e anseios do contexto social, político e econômico imediato a cada curso de formação.

4º - Conclui-se que, embora em desacordo com a jurisprudência do CFE quanto à forma de apresentação do que se convencionou chamar “currÍculo mínimo”, a linha de desenvolvimento curricular apresentada pela proposta, em sua essência, não contraria o estabelecido pelo artigo 26 da Lei 5540/1968, entendendo-se isto sim, muito mais como uma evolução do que estabeleceu a Indicação 8/68 e, também, o Parecer 85/70.

Ao analisar esse problema, o Grupo de Trabalho iniciou procurando interpretar o significado e a intenção do disposto no referido artigo:

“Art. 26 – O Conselho Federal de Educação fixará o currículo mínimo e a duração mínima dos cursos superiores correspondentes às profissões reguladas em Lei e de outros necessários ao desenvolvimento nacional.”

 A intenção do dispositivo em questão é garantir a unidade no processo de formação desses profissionais. Para isso não determina a Lei que os cursos devam ser iguais quanto ao perfil desejado, à estruturação e às matérias que comporão seu currículo.

 O que estabelece é que caberá ao CFE garantir a pretendida unidade através da fixação do currículo mínimo e da duração mínima dos cursos superiores.

 É, pois, no entendimento amplo do conceito de currículo (e a partir dele, o do que seja currículo mínimo) que se situa no âmago da questão. Nesse sentido, de há muito a idéia de currículo deixou de significar a de um mero rol de matérias e disciplinas.

 A proposta apresentada adotou a linha de uma listagem de matérias, preferindo fazê-lo pela definição de referenciais para caracterização do perfil dos profissionais a serem formados; pela definição das áreas de abrangência para o atingimento do perfil pretendido, dentro das quais seriam definidas as matérias e disciplinas do currículo; a duração mínima para garantir a universalização do diploma; a carga horária mínima para a integralização da duração mínima do curso e as parcelas dessa carga horária que devem ser destinadas à “Formação Geral” e ao “Aprofundamento de Conhecimentos”.

 Com isso, está assegurada a unidade pretendida, principalmente em se tratando de uma atividade multidisciplinar como é a Educação Física, que abrange um universo de conhecimentos muito amplo e que podem ser organizados de forma diferenciada, dependendo da linha profissional, da tradição da cultura profissional de cada país ou região. Assim, seria um lado pretensioso e de outro empobrecedor definir um elenco de matérias para todos os cursos de Educação Física do País, mesmo que a título de currículo mínimo.

 Esta proposição baseou-se em inúmeras constatações em nível internacional e em nível nacional.
 O exame dos currículos dos cursos superiores de educação Física de instituições européias e da América do Norte, como mostram os trabalhos de Cagigal (1977), Dufour (1977) e FIEP (1977), revela que os currículos em nível de excelência em Educação Física (embora na maioria delas não haja a obrigatoriedade da existência da figura do “currículo mínimo”) sempre contêm campos e, por haver essa diversidade, eles abarcam grandes áreas de conhecimentos.

 A experiência de países onde as instituições universitárias contribuem efetivamente para o desenvolvimento, mostra que isso se produz na competência de cada instituição do ensino superior auto-dirigir-se e elaborar o currículo que melhor se ajuste ao perfil do profissional pretendido.

 Recentes consultas mandadas proceder em instituições japonesas, americanas e alemãs comprovam essa prática e a atualidade da linha proposta.

 O exame da experiência brasileira, no campo da formação dos profissionais para atuarem na Educação Física e nos Desportos, no que concerne à adoção do “currículo mínimo” determinado – caracterizado apenas por um rol de matérias comuns a todos os cursos – revela fatos estarrecedores.

 Por um lado, esse “currículo mínimo” em muitas instituições, sem receber qualquer acréscimo, é tomado como o próprio currículo pleno.
 De outra parte – e isso quase que como regra geral – não se constata qualquer preocupação com a definição do perfil do profissional que resultará da estruturação curricular adotada. A partir desse “currículo mínimo”, as IES acrescentam disciplinas de enorme abrangência de conteúdo na área desportiva; algumas outras de conteúdo formativo no campo pedagógico, aparecendo de quando em quando disciplinas com aspectos programáticos e desconexos, com tratamento meramente informativo e superficial na área biológica e humana.
 Pode-se dizer mesmo que, devido às características da maioria dos currículos adotados, nesses cursos, a Educação Física não é pensada como um campo de conhecimento específico.

 Daí a razão pela qual o Grupo de Trabalho entendeu devesse ser adotada a linha geral de desenvolvimento apresentada pela proposta  quanto à caracterização do que seriam os mínimos curriculares obrigatórios, mesmo consciente de que ela poderia vir a ser entendida como em desacordo com o pensamento do CFE expresso pelo Parecer 85/70:

“O currículo mínimo poderá ser uno, constituído de uma relação de matérias obrigatórias para todos os casos, ou admitir diversificações, abrangendo, nesta última hipótese, uma parte fixa comum para todas as escolas e alunos, e outra variável, constante de uma lista de matérias, das quais os estabelecimentos escolherão tantas quantas forem determinadas pelo CFE.”

 Essa visão – que poderia ser válida há mais de 15 anos atrás – tem que ser dinâmica, para acompanhar a própria evolução que se faz necessário introduzir no ensino superior brasileiro como um todo.
 
 5º - Reconheceu-se a necessidade, como prevista oficialmente pela proposta de reformulação curricular (Curitiba/1982), de haver, complementarmente à proposta, estratégias para implementação, acompanhamento e avaliação da mesma.

 Essas estratégias poderiam ser referenciadas tal como no quadro-resumo que se segue:

Proposta

Implementação

Avaliação

 

1 . Introdução
Esboço histórico

2. Caracterização
- Nova maneira de pensar a educação Física;
- Perfil do graduado (licenciado/bacharel);
- Observância dos referenciais expressos pelos campos de conhecimentos definidos.

3. Organização Curricular

  • Objetivos;
  • Composição;
  • Duração.

 

 

 

 

1. Preparação Inicial
- Restrições e facilidades;

  • Quando;
  • Quem (alternativas)
  • Critérios para seleção;
  • Decisão.

2. Planejamento

  • Objetivos;
  • Recursos;
  • Ações;
  • Cronograma.

3. Execução

  • Mobilização necessária;
  • Desenvolvimento;
  • Ações previstas.

 

1. Preparação

  • Para que?
  • Para quem?
  • Quando?
  • Quem fará?
  • Alternativas e critérios, decisão.

2. Planejamento

  • Objetivos;
  • Recursos;
  • Preparação instrumental;
  • Treinamento de pessoal;
  • Coleta de dados;
  • Análise e interpretações;
  • Conclusões e recursos.

3. Execução

  • Coleta de dados;
  • Tratamento, análise e interpretações, conclusões e recomendações.

4. Relatório

5. Revisão Crítica

As estratégias previstas, tanto oportunizariam a minimização de distorções em nível de IES quanto ao espírito de orientação da estruturação curricular proposta, como propiciaria, também, mecanismo de retroalimentação e conseqüente atualização curricular.
 
 6º - Reconheceu-se que a aceitação por parte das IES da proposta em questão foram assumidas, na verdade, as responsabilidades que a liberdade lhes outorga, traduzindo-se assim, numa real carta de idoneidade da instituição.
 
 Consolidadas essas conclusões, a partir delas, a proposta foi mais uma vez reajustada e remetida aos 96 cursos de Educação Física agora em funcionamento no País, devidamente acompanhada pela justificação das medidas adotadas (Of. CFE 1672/86, de 16/07/86).
 Nos dias 2 e 3 de setembro último, reunido o Grupo de Trabalho, ainda em Brasília, foram processadas e cuidadosamente analisadas as 40 respostas recebidas (varias delas englobando a opinião de grupos de IES situadas em um mesmo estado ou região).

 Dessas 40 manifestações, 26 concordaram in totum, 10 mencionam concordância em, principalmente, 5 itens.
 Há discordâncias em aspectos pertinentes e outros não, por parte de 10 instituições.

 Foram apresentadas 42 sugestões, algumas aproveitadas outras não, a saber:

- 2 referem-se ao curso de bacharelado, ainda em discussão;
- 5 referem-se à formação do profissional para atuar no esporte – performance para a qual haverá um grupo de trabalho previsto para estudar o assunto;
- 9 foram aproveitadas;
- 29 ou não eram assunto para proposta curricular; ou já estão contempladas na proposta; ou alteram substancialmente a proposta sem vantagen