Muito além do Lugar Comum
Alguns Profissionais se destacam por fazer das aulas de Educação Física verdadeiras experiências de vida para os alunos. São
os mestres que não se atêm somente ao que manda o usual ou o convencional.
Estes se destacam justamente por ir além. Nesta edição trazemos dois casos de Profissionais que se encaixam
perfeitamente nesse exemplo: Jairo José de Souza Júnior [CREF 008702-G/MG] e
Kaled Ferreira Barros [CREF 083175-G/SP]. O primeiro criou em uma escola estadual um Departamento de
Educação Física (DEF) que é responsável pelas atividades de treinamento,
pesquisa, ensino e extensão no campo da Educação Física. O outro resolveu
deixar o tradicional Futebol e investir em Capoeira, atividade totalmente nova
para os alunos. Os resultados não poderiam ser melhores. Conheça as experiências de sucesso desses professores que são exemplo e não se contentam em ficar no lugar comum.
Departamento de Educação Física:
multiplicando saberes
Dentro da Universidade é responsabilidade dos Departamentos atuar em todos os âmbitos do tripé acadêmico.
Incentivando, desenvolvendo e distribuindo atividades de Ensino, Pesquisa e Extensão entre os docentes. Mas e na rede básica de ensino,
como ele funciona? Aliás, tem departamentos dentro das escolas?
Em Virginópolis, município do
estado de Minas Gerais, mais especificamente na Escola Estadual Nossa Senhora do Patrocínio, os alunos contam sim, desde 2011,
com um Departamento de Educação Física (DEF). O projeto, completa- mente
voluntário, é responsável pelas atividades de treinamento, pesquisa, ensino e
extensão no campo da Educação Física.
Sua perspectiva interdisciplinar busca contribuir com o desenvolvimento crítico, criativo e inventivo de monitores, alunos e toda a comunidade escolar, como explica Jairo José de Souza Júnior [CREF 008702-G/MG], Professor da instituição e coordenador do projeto. “Já há algum tempo eu
imaginava desenvolver um departamento de educação física na escola. Tarefa
difícil, mas nada impossível, eu pensava. Conversava com as pessoas
a respeito dessa possibilidade, mas muitos não acreditavam. Acreditava nos
benefícios de ter uma ferramenta como essa em prol da Educação Física e até
mesmo da própria escola. Eu imagina, pensava e sonhava”.
Além do coordenador, fazem parte
do projeto uma nutricionista e oito alunos do 2º grau, que atuam como
monitores. Para ocupar o cargo, os alunos passam por uma avaliação física e são
instruídos sobre vários assuntos, como primeiros socorros, por exemplo. O projeto funciona três vezes por semana e
atinge cerca de 100 alunos, entre 7 e 17 anos. A sala onde funciona o departamento foi cedida pelo colégio e conta com
computador, impressora, televisão, aparelho de som, programa de avaliação física, materiais e aparelhos para avaliação
física e nutricional, bolas, cones, coletes, dentre outros.
Visando a produção do conhecimento interdisciplinar e resultados significativos, o DEF
conta ainda com os demais docentes e discentes para a manutenção dos Núcleos de Extensão. São eles: o Núcleo de Composição Corporal (NUCOMCOR) que promove programas relacionados à melhora da aptidão física e das condições de saúde
individual ou coletiva, bem como na prevenção e tratamento de sobrepeso e obesidade; o Núcleo de Teatro e Esportes (NUTE) desenvolve atividades
lúdico-recreativas e esportivas visando contribuir na formação do cidadão, além de desenvolver a comunicação/ expressão através de uma investigação corporal; o Núcleo de
Esportes (NUES) aplica, multiplica e mostra o conceito de esporte como fator
educacional e de desenvolvimento humano.
De acordo com o coordenador, o objetivo principal do projeto não é formar atletas, mas trabalhar a inclusão de todos os alunos no esporte e contribuir com a educação através do mesmo. E as mudanças já são perceptíveis. Os alunos mudaram positivamente seus comportamentos no que se refere à disciplina, e socialização ao encontrar no esporte uma ferramenta fundamental para a melhoria da qualidade de vida. Além disso, muitos ex-alunos hoje estão cursando a faculdade de Educação Física, comprovando a dedicação e doação dos integrantes do projeto.
Mas o sucesso do Departamento foi
além e em 2012 o projeto foi se- lecionado e elogiado, entre os poucos
programas de Educação Física, pela Superintendência - que convocou os
professores envolvidos a participarem da montagem do caderno de boas práticas
da Secretaria de Estado de Edu- cação de Minas Gerais. Jairo enfatiza que um
projeto como esse, envolve crenças e valores, relacionando-se diretamente à
comunidade. “Fomentar um projeto e
colocá-lo em prática não é uma tarefa fácil. Porém pensar e executar um projeto
pedagógico nos faz refletir sobre a finalidade e o papel da escola na
sociedade”, reforça.
Na roda: tolerância racial,
cultural e religiosa
Quando começou a lecionar no
Colégio Ônis, em Santos (SP) no ano de 2010, o Profissional de Educação Física, Kaled Ferreira Barros [CREF 083175-G/SP] foi pelo caminho mais fácil. Devido à insegurança
pela pouca experiência, Kaled acabou por explorar apenas os esportes com bola.
No ano seguinte, bem mais seguro do seu potencial e a fim de fugir da “cultura
de bola”, o Professor decidiu trabalhar com seus alunos a Capoeira.
As orientações dadas por meio dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a obrigatoriedade da Lei 10.639/03, bem como o interesse em ampliar os
horizontes dos educandos, foram fundamentais na sua decisão. Além disso, ainda em 2011 seria comemorado o Ano Internacional dos Afrodescendentes. “O objetivo desta iniciativa foi fortalecer o compro- misso político de erradicar a
discriminação a descendentes de africanos e, também, promover o respeito à
diversidade e heranças culturais. Portanto, uma ótima oportunidade para
trabalhar a Capoeira como tema das aulas de Educação Física”, explica o
Profissional.
A partir daí foi elaborado um
projeto para os educandos do 4º e 5º ano sobre o ensino da Capoeira durante os meses de maio, junho e agosto. Além de rever as atitudes
preconceituosas e ações discriminatórias na nossa sociedade, os objetivos
específicos do projeto focaram no domínio das técnicas convencionais de ataque
e esquiva; na identificação e compreensão do universo simbólico da modalidade; no
respeito à diversidade e heranças culturais; na valorização e preservação do
patrimônio cultural e na participação de situações que promovam aprendizagem
intergeracional.
Durante a primeira roda de
conversa, surgiram comentários e muitas dúvidas: A Capoeira é uma luta? É dança, já que tem música? Se não encosta-se ao outro, é demonstração? Ao
final da conversa foi constatado que a Capoeira não era um elemento estranho
aos educandos, entretanto, o conhecimento era apenas superficial.
Na vivência corporal, os educandos
conheceram e aprenderam a ginga, algumas esquivas e ataques básicos, além dos
deslocamentos por meio dos aús – conhecido popularmente por estrela. “No início
alguns alunos apresentaram certo grau de inibição, mas no decorrer das aulas ela foi deixada de lado e a curiosidade em
explorar as capacidades físicas e coordenativas foi ganhando espaço”, conta
Kaled.
Mas o projeto ia muito além da
prática. Para a semana alusiva à Abolição da Escravatura, os alunos do 4º ano
produziram um varal pedagógico, com exposições orais e palestra sobre o tema
“Diversidade Cultural e a Figura do Ancião dentro das Comunidades Africanas”.
Houve ainda projeção de vídeo, roda de conversa sobre religião e tolerância,
vivência instrumental, aula teórica de capoeira entrelaçando o tema: Respeito e
Preservação do Patrimônio Cultural Brasileiro e visita às Ruínas do Engenho de
São Jorge dos Erasmos, monitoradas por educadores da Universidade de São Paulo
(USP). Atividades que fizeram deste, um projeto interdisciplinar e inesquecível
para todos os envolvidos.
Para a semana do Dia do Capoeirista, bem como na última aula do trimestre, foram
realizadas rodas de capoeira pelos próprios educandos, eles tocaram os
instrumentos, jogaram capoeira e responderam ao coro das cantigas cantadas pelo
professor. Se no início do trimestre era comum ver risos ou chacotas daqueles mais desengonçados, com o passar das aulas notou-se uma mudança gradual e progressiva nas relações por
meio de atitudes e comportamentos solidários e afetuosos.
“Como os próprios educandos
descreveram, foi um desafio. Um desafio que exigiu a participação e a dedicação
de todos para atuarem coletivamente, a crença de que todos são capazes, a
superação em melhorar o que sabem fazer e a segurança em colocar o aprendizado
em prática” conta com orgulho o professor.
Atualmente Kaled continua na
coordenação do projeto, agora no formato de curso extracurricular. Para esse
ano a Coordenação Pedagógica do colégio propôs uma proposta interdisciplinar
em conjunto com os professores de Informática e de Ciências, de
nome “Prova e Comprova”. Quem sabe Kaled não conta essa experiência em uma próxima edição? Desejamos sucesso!